Aprenda o que é Descrever – Descrição

exercício-enem-interpretacao-descomplica (10)Descrever é representar com palavras um objeto - uma coisa, uma pessoa, uma paisagem, uma cena, ou mesmo um estado, um sentimento, uma experiência etc - fundamentalmente por meio de nossa percepção sensorial, nossos cinco sentidos: visão, tato, audição, olfato e paladar.

No texto descritivo, o sujeito cria uma imagem verbal do objeto - entenda-se a palavra no sentido mais amplo possível -, dando suas características predominantes, apresentando os traços que o singularizam, de acordo com o objetivo e o ponto de vista que possui ao realizar o texto.

Leitura Comentada: Um Texto Descritivo

Ela possuía a dignidade do silêncio. Seu porte altivo era todo contido e movia-se pouco. Quando o fazia, era como se estivesse procurando uma direção a seguir; então, encaminhava-se diretamente, sem desvios, ao seu objetivo.
O cabelo era louro-dourado, muito fino e sedoso, as orelhas pequenas. Os olhos tinham o brilho baço dos místicos. Pareciam perscrutar todos os mistérios da vida: profundos, serenos, fixavam-se nas pessoas como se fossem os olhos da consciência, e ninguém os aguentava por muito tempo, tal a sua intensidade. O olho esquerdo tinha uma expressão de inquietante expectativa.
Os lábios, de rebordos bem definidos, eram perfeitos e em harmonia com o contorno do rosto, de maçãs ligeiramente salientes. O nariz, quase imperceptível na serenidade meditativa do conjunto. Mas possuía narinas que se dilatavam nos raros momentos de "cólera sagrada", como costumava definir suas zangas.
A voz soava grave e profunda. Quando irritada, emergia rascante, em estranha autoridade, dotada de algo que infundia respeito. Tinha um pequeno defeito de dicção: arrastava nos erres por causa da língua presa.
A mão esquerda era um milagre de elegância. Muito móvel, evolucionava no ar ou contornava os objetos com prazer. No trabalho, ágil e decidida, parecia procurar suprir as deficiências da outra dura, com gestos mal controlados, de dedos queimados, retorcidos, com profundas cicatrizes.
Cumprimentava às vezes com a mão esquerda. Talvez por pudor, receosa de constranger as pessoas, dirigia-se a elas com economia de gestos. Alguns de seus manuscritos eram quase ilegíveis. Assinava com bastante dificuldade, mas utilizava ambas as mãos para datilografar.
Era profundamente feminina, exigia e se exigia boas maneiras. Bem cuidada no vestir, vaidosa, mas sem sofisticação.
Nunca saía sem estar maquilada e trajada às vezes com algum requinte: turbante, xale, vários colares e grandes brincos. O branco, o preto e o vermelho eram uma constante em seu guarda-roupa.
O batom geralmente era de tom rubro forte; o rímel negro, colocado com sutileza, aumentava a obliquidade e fazia ressaltar o verde marítimo dos olhos. Indiscutivelmente era mulher interessante, de traços nobres e, talvez, inatingível.
Quanto à afetividade, acreditava que, quando um homem e uma mulher se encontram num amor verdadeiro, a união é sempre renovada, pouco importando brigas e desentendimentos.
Ambicionava viver numa voragem de felicidade, como se fosse sonho. Teimosa, acreditava, porém, na vida de todos os dias. Defini-la é difícil. Contra a noção de mito, de intelectual, coloco aqui a minha visão dela: era uma dona-de-casa que escrevia romances e contos.
Dois atributos imediatamente visíveis: integridade e intensidade. Uma intensidade que fluía dela e para ela refluía. Procurava ansiosamente, lá, onde o ser se relaciona com o absoluto, o seu centro de força - e essa convergência a consumia e fazia sofrer. Sempre tentou de alguma maneira solidarizar-se e compreender o sofrimento do outro, coisa que acontecia na medida da necessidade de quem a recebia. O problema social a angustiava.
Sabia o quanto doíam as coisas e o quanto custava a solidão.
São muitos os "mistérios" que aos olhos de alguns a transformaram em mito. Simplesmente, porém, em Clarice não aparecia qualquer mistério. Ela descobria intuitivamente o mistério da vida e do ser humano; em compensação, era capaz de dissimular o seu próprio mistério.

(Olga Boreli - Clarice Lispector, Esboço para um possível retrato - texto adaptado - Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981)

Vejamos, comentando o texto apresentado, algumas características fundamentais do texto descritivo:

Descrição: Objetivo e Ponto de vista

acesse aqui o descomplicaRepare que o objetivo da autora, no texto lido, é traçar um perfil físico e psicológico de Clarice Lispector, grande escritora da literatura brasileira, de quem foi amiga.

O seu ponto de vista ao realizar a descrição pressupõe, portanto, proximidade com o objeto descrito, o que percebemos pela grande quantidade de detalhes reveladores de convivência íntima, presentes no texto.

Além disso, a imagem de Clarice que Olga Boreli pretende transmitir ao leitor está explicitada na seguinte passagem do texto: Defini-la é difícil. Contra a noção de mito, de intelectual, coloco aqui a minha visão dela: era uma dona-de-casa que escrevia romances e contos.

Perceba que para recriar descritivamente esta imagem, ou seja, para colocar a sua visão, o seu ponto de vista a respeito da escritora, a autora ora se detém em características físicas, ora em características psicológicas, e mais comumente mescla ambos os tipos de características, fazendo com que reciprocamente se iluminem. Ao mesmo tempo, tais características vão ao encontro do ponto de vista defendido, fundamentando-o.

Exemplo:

Características físicas:

Nunca saía sem estar maquilada e trajada às vezes com algum requinte: turbante, xale, vários colares e grandes brincos. O branco, o preto e o vermelho eram uma constante em seu guarda-roupa.

Características psicológicas:

Ambicionava viver numa voragem de felicidade, como se fosse sonho. Teimosa, acreditava, porém, na vida de todos os dias.

Mescla de características físicas e psicológicas:

Os olhos (...) pareciam perscrutar todos os mistérios da vida (...) fixavam-se nas pessoas como se fossem os olhos da consciência, e ninguém os aguentava por muito tempo, tal a sua intensidade.

O nariz quase imperceptível na serenidade meditativa do conjunto. Mas possuía a narinas que se dilatavam nos raros momentos de "cólera sagrada", como costumava definir suas zangas.

O batom geralmente era de tom rubro forte; o rímel negro, colocado com sutileza, aumentava a obliquidade e fazia ressaltar o verde marítimo dos olhos. Indiscutivelmente era mulher interessante, de traços nobres e, talvez, inatingível.

Conclusões importantes

Por meio destes exemplos concluímos que tanto o objetivo da descrição quanto o ponto de vista do sujeito em relação ao objeto descrito devem ser minuciosamente observados, para se criar esse tipo de texto.

Em outras palavras, na descrição a seleção dos traços, das características que mostrarão ao leitor como é um determinado objeto, deve ser elaborada pelo sujeito de forma coerente e adequada com seu objetivo e ponto de vista ao descrever.

Entretanto, antes de selecionar é preciso enumerar, isto é, fazer uma lista de traços, características e detalhes do objeto, da maneira mais livre possível.

Você pode se colocar em diferentes perspectivas (próximo, distante, atrás, na frente, em cima, embaixo, do lado etc) em relação a ele, pode conjugar memória e imaginação, pode pensar se considerou todos os sentidos ao descrever (visão, tato, audição, olfato, paladar), pode misturar sensações com sentimentos, emoções, reflexões.

Só não deve bloquear este fluxo pensando antecipadamente na montagem, na organização final do texto. Este processo vem depois, quando você já tem os elementos necessários para cortar o que está repetido, acrescentar o que falta, hierarquizar em principais e secundários os aspectos escolhidos, enfim, ajustar o como ao porquê: o tipo de texto (por exemplo: com maior objetividade ou maior subjetividade, presença expressiva de detalhes ou linguagem mais enxuta, ponto de vista mais próximo ou mais distante, favorável ou desfavorável etc) ao contexto de produção (os objetivos do texto e a situação que gerou a necessidade de escrevê-lo).

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